Hoje penso, de modo particular, nos migrantes que foram forçados a abandonar a sua terra e a deixar para trás os seus familiares, fugindo, sobretudo da guerra, da fome e das consequências das alterações climáticas, numa tentativa desesperada de salvar a própria vida. Ao longo dessa árdua jornada, enfrentaram noites de medo e solidão, permanecendo, em muitos casos, sujeitos à discriminação e à violência.
O dia 18 de dezembro assinala o Dia Internacional dos Migrantes, data que coincide com a adoção, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1990, da Resolução relativa à Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das Suas Famílias. Decorridos cerca de trinta e cinco anos, a Convenção entrou em vigor, foi ratificada e encontra-se em aplicação em muitos países, incluindo Cabo Verde. Apesar destes avanços, o balanço global continua muito aquém do que seria desejável, face aos desafios persistentes e à vulnerabilidade de milhões de migrantes.
A realidade atual é profundamente preocupante. Muitas vítimas de sucessivas tragédias, ao procurarem escapar à morte, tornam-se alvos do tráfico humano e de barreiras intransponíveis. Lamentavelmente, milhares de vidas são descartadas nas extensas areias do deserto ou naufragam em mares profundos, evidenciando o fracasso global em garantir que a Terra seja um lar digno para todos. Mesmo poucos dias após a celebração dos 75 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, assistimos à sua violação sistemática. É imperioso reafirmar: todas as vidas têm igual valor.
Frente a esta realidade, urge evitar a criminalização dos migrantes, cuja condição de “ilegalidade” é frequentemente explorada para sujeitá-los a trabalhos forçados e a situações degradantes. Apelamos, portanto, a um compromisso inequívoco com a vida, a dignidade e os direitos humanos.
É de justiça contextualizar que sempre houve fluxos migratórios, entre países ou continentes, motivados por perseguições, crises económicas ou necessidades de sobrevivência, e que geraram benefícios tanto nas sociedades de origem quanto nas de destino. Um exemplo paradigmático é a emigração de europeus para a América do Norte e América do Sul.
Cabo Verde não é exceção. Historicamente, os cabo-verdianos migraram por todo o mundo. Nas últimas décadas, o nosso país também tem acolhido milhares de cidadãos imigrantes, contribuindo para a diversidade de raças, línguas, confissões religiosas, gastronomia e riqueza cultural.
Trata-se de um cenário novo, que nos enriquece, mas, ao mesmo tempo, aporta desafios em termos de tolerância, empatia, respostas sociais e políticas em prol de justiça, dos Direitos Humanos e de coesão social, tudo sob o manto da nossa Constituição, que consagra o direito à igualdade e não discriminação, especialmente em razão de raça, ascendência, língua, origem ou religião.
Neste contexto, convoco todos os imigrantes a regularizarem a sua documentação, garantindo assim os seus direitos, enquanto contribuem para o desenvolvimento de Cabo Verde nos mais diversos setores. O nosso país, fiel à sua tradição de “morabeza”, acolhe todos quantos optam por viver ou trabalhar entre nós, independentemente da nacionalidade, promovendo uma sociedade inclusiva, em que os migrantes não constituem um fardo, mas uma riqueza humana, cultural e social.
Renovo a convocação à solidariedade e ao respeito aos Direitos Humanos, e que sejam encontradas as melhores soluções para precaver e impedir as migrações decorrentes de situações aflitivas, e pôr termo ao elevado número de migrantes que são vítimas do naufrágio de Estados, de massacres indiscriminados, e de políticas sociais e económicas ineficazes. No atual e preocupante contexto político internacional, particularmente na Europa, com o recrudescimento de movimentos populistas e extremistas, urge apelar a políticas de integração.
Enquanto Presidente da República, manifesto votos firmes por um futuro melhor para todos, pautado pela dignidade, solidariedade e justiça social.

