Discurso proferido por S.E. o Presidente da República, Jorge Carlos de Almeida Fonseca, por ocasião da Sessão Solene do Dia do Município do Maio e Santa Padroeira

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Ilha do Maio, 07 de Setembro de 2018

“É com enorme satisfação que, uma vez mais, estou nesta bela ilha, povoada de gente sem maldadi e que, com determinação e confiança no futuro, vem lutando para vencer as vicissitudes que a mãe natureza nos impõe, encorajando-nos, deste modo, a mantermo-nos de pé, firme nesta caminhada do desenvolvimento harmonioso sem o qual a nossa sociedade perderá a sua força identitária e a sua coesão.
É com muita honra e incontido prazer que me associo às festas do município e de Nossa da Luz, Padroeira da ilha do Maio. Estas ocasiões são momentos muito especiais de reafirmação da identidade colectiva, quadro em que cada maiense se revê na construção da sua especificidade, parte de uma personalidade cabo-verdiana.

Acredito que ser maiense integra um conjunto de valores, percepções, registos de paisagens da ilha ao longo do tempo, desejos e ambições, afectos, avaliações diferenciadas de conquistas e desaires, que, real ou potencialmente, tiveram e continuam a ter a ilha – entidade física e cultural- por cenário e parte de uma entidade mais vasta que é Cabo-Verde.
Assim, para além dos aspectos político-institucionais e religiosos, essas celebrações têm o condão de avivar essa realidade, de consolidar esse sentimento de pertença que impregna a nossa alma e que, em todas as circunstâncias, em todos os locais, nos fazem sentir maiense, bravense, sanvicentino ou santiaguense e, simultaneamente, cabo-verdiano.
É evidente que estas circunstâncias nos levam também a ponderar, sobre o que podemos fazer para que as dificuldades sejam superadas com a rapidez possível.
Ainda que os objectivos essenciais de todos seja o bem comum, a concepção desse valor não é mesma para todos, acontecendo o mesmo com os caminhos para o atingir.
Aliás, as diferenças de pontos de vista ficaram patentes nas intervenções anteriores, o que é muito salutar para a democracia, que reconhece ao vencedor dos pleitos eleitorais o direito e a legitimidade para governar e concretizar o programa sufragado pelos eleitores e garante à oposição democrática, que representa uma parcela da sociedade, o direito de criticar, de discordar das propostas e soluções da maioria.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Tenho acompanhado, com agrado, alguma dinâmica que se tem procurado imprimir a esta ilha e que tem encontrado eco no poder central.
Entendo que uma relação dinâmica que o Governo central tem procurado estabelecer com o poder local é muito positiva, pois abre caminho para que as potencialidades locais sejam, de facto, valorizadas.
Neste quadro, inscreve-se a perspectiva de resolução do importantíssimo problema do Porto do Maio, infraestrutura decisiva para a normal circulação das pessoas e bens, essencial para o desenvolvimento da ilha.
Regozijo-me com essa perspectiva que vem ao encontro de uma das maiores aspirações do maiense. Desejo ardentemente que ela se concretize rapidamente e que a disponibilização de barcos que assegurem ligações marítimas regulares e seguras seja uma realidade nos próximos tempos.
Num país arquipelágico a ligação marítima é determinante para o bem-estar das pessoas e o desenvolvimento das actividades económicas.

Senhor Presidente
Caros Concidadãos

As opções económicas e de desenvolvimento adoptadas para Cabo Verde ao longo dos anos têm propiciado a colocação da Ilha na periferia, pelo que a mais importante missão desta edilidade e dos demais actores políticos, económicos, sociais e culturais é a de atalaia atenta com o propósito de descortinar e afastar os eventuais propósitos ou soluções susceptíveis de consagrar ou reforçar o carácter periférico da Ilha, facto que, a acontecer, cristalizará, quase que em definitivo, a desigualdade entre cidadãos nociva à estabilidade e à harmonia indispensáveis para a construção do País que almejamos.

Assim sendo, é de suma importância que se executem medidas que, pela sua pertinência, reduzam, significativamente, o custo da periferia tendo como propósito elevar a atractividade da Ilha tanto para as pessoas quanto para as empresas. Neste sentido, não se deve apenas ficar pela atracção dos operadores turísticos, mas também e, sobretudo, dos investidores nacionais e estrangeiros que desejam explorar potencialidades outras que o turismo sol e mar. Uma tal postura implica, necessariamente, resistir à tentação da avaliação da Ilha do Maio em função da sua importância demográfica valorando, antes, a sua indispensabilidade na viabilização do sistema cabo-verdiano. Na verdade, a importância da Ilha do Maio, da Brava e do São Nicolau na operacionalização do processo de desenvolvimento do país exige que não faça sentido marchar nas veredas conducentes ao isolamento destas Ilhas, sob pena de se comprometer a edificação de uma sociedade que garanta, a todos, a possibilidade da realização pessoal participando na construção da Casa Cabo Verde.

Tudo isso, porém, poderá não passar de mero sonhos e desejos se o Município não se dotar de uma capacidade endógena para definir autonomamente as suas prioridades, pensar e conceber os seus projectos, mobilizar recursos e negociar com o Poder Central o financiamento e a execução de cada um dos projectos que, aos olhos da Câmara, são fundamentais para o Município. É evidente que a criação desta capacidade endógena supõe a mobilização da sociedade civil e dos filhos da Ilha que residem nas outras ilhas ou no estrangeiro. Esta desejada participação cidadã é possível se se estabelecer um diálogo frutífero, porque sincero, entre as autoridades locais e as organizações da sociedade civil. Isto é, será preciso que a Câmara não seja centralizadora e promova, genuinamente, a participação cidadã nos assuntos do Concelho. Esta pré-disposição para o envolvimento cooperativo do cidadão nos assuntos do Município contribuirá, drasticamente, para a diminuição do risco da subalternidade, facilitando uma relação de parceria entre os dois Poderes.

Na verdade, só uma relação de parceria e não a de subalternidade permite reduzir o custo da periferia que se traduz numa desigualdade entre cidadãos expressa através da disparidade na distribuição dos recursos materiais, dos recursos sociais e políticos e dos recursos simbólicos da sociedade. Estas dimensões retroalimentam-se e dão origem a outras desigualdades como as que se verificam no acesso ao serviço de saúde e ao ensino superior. Realmente, é muito mais custoso para um jovem desta Ilha ou da de São Nicolau ou mesmo da Brava aceder ao ensino universitário do que para um outro residente em espaços urbanos como Praia e Mindelo. Assim sendo, negociar com o Governo Central as formas de eliminar os custos da periferia é uma urgência que se impõe à Edilidade desta Ilha pela imperiosa necessidade de se evitar a reprodução da desigualdade nas gerações sucessivas.

Senhor Presidente da Câmara Municipal
Minhas Senhoras e Meus Senhores

Reduzir a desigualdade social com origem no custo da periferia agravada pelas escolhas públicas é tão importante como promover o desenvolvimento da Ilha a partir de um sector do turismo ancorado na economia local e que contribui para uma outra valorização de outras vertentes e potencialidades deste Município. E a este propósito, julgo que, neste momento, há condições para a exploração económica do turismo doméstico voltado para a terceira-idade e para jovens nos períodos de férias escolares. Promover retiro e campos de férias para idosos, encorajar operadores económicos e jovens da Ilha a organizar colónias de férias para jovens de outras ilhas do País e propor um pacote “fins-de-semana no Maio” serão, seguramente, um passo importante na promoção do turismo doméstico.

Em verdade, num contexto em que dificilmente a Ilha do Maio poderá rivalizar, por ora, com a do Sal e a da Boa Vista, a aposta no turismo doméstico, ou internacional de altíssimo padrão, sem descurar as experiências de turismo solidário que já envolve famílias maienses e que devem ser aprofundadas, podem conceder à Ilha o estatuto que têm hoje aquelas duas ilhas na promoção do turismo internacional.
Efectivamente, sem descurar as oportunidades que o turismo internacional possa oferecer, um turismo doméstico inicialmente virado para a exploração do poder de compra da classe média de Santiago e que, gradualmente, se abrirá as outras ilhas contribuirá, substancialmente, para a redinamização da economia local e, por esta via, para o seu desenvolvimento económico.

Deve-se, no entanto, ter-se presente que transformar a Ilha do Maio no epicentro do desenvolvimento do turismo doméstico é, de uma certa forma, fazer da Ilha um centro de consumo, possível unicamente se se relançar a produção local porquanto não é desejável que o turismo, que se quer doméstico, se alimente, essencialmente, de produtos importados. Aliás, esta é a condição indispensável para que a relação entre a actividade turística e o desenvolvimento da Ilha do Maio seja, encorajadoramente, positiva. Para o efeito, é preciso que instituições como Pro-Empresa e Instituto do Emprego e Formação Profissional tenham uma postura proactiva e proponham um pacote específico englobando a formação, assistência técnica e incentivos à criação, consolidação e expansão de actividades económicas enquanto suporte à estratégia de desenvolvimento do turismo local nesta Ilha.
Porém, tudo isso deve ser feito no pressuposto de que o Poder Local e o Central estarão empenhados em resolver, definitivamente, o problema da mobilidade inter-ilhas sem a qual não se pode ter a aspiração de um desenvolvimento económico local, o fim do isolamento desta Ilha e a sua consequente integração no sistema cabo-verdiano.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Ainda estamos sob os efeitos do mau ano agrícola que teve repercussões negativas em todo o país apesar dos grandes esforços despendidos pelo Governo para obter e distribuir recursos e apoio técnico aos agricultores e criadores de gado, tendo os criadores do Maio recebido apoio suplementar em decorrência das grandes dificuldades vividas.
Na oportunidade, renovo a minha solidariedade para com os agricultores e criadores do Maio e do país. Creio que existe uma convicção generalizada segundo a qual as medidas de mitigação do mau ano agrícola foram muito importantes para atenuar os seus impactos. Porém, alguns sectores entendem que poderiam ter sido mais eficazes e que foram prejudicadas por problemas de transporte, organizativos, entre outros.
Ainda que não se possa pôr em causa os efeitos muito positivos dessas medidas, é provável que esse grande esforço pudesse ter efeitos mais efectivos, se não tivessem existido tais constrangimentos que teriam contribuído para algum atraso na concretização das medidas.
Entendo que seria muito bom, que, logo que possível, se procedesse a uma reflexão desapaixonada de todo o processo, envolvendo os principais interessados, com vista ao aprimoramento do mesmo, porque, como sabemos, não estamos imunes a situações semelhantes.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Registei com muita satisfação e retribuo as generosas palavras que me foram dirigidas.
Agradeço à Camara Municipal, especialmente ao meu amigo e Presidente Michel….pelo convite formulado para estar nesta ilha de gente muito especial neste dia particularmente importante.
Interpreto o gesto não apenas na sua vertente protocolar mas, essencialmente, na perspectiva do fortalecimento de uma relação alicerçada numa grande afetividade e solidariedade.
Um feliz dia do município e Santa Padroeira para todos”.

Muito obrigado.