CEDEAO: DESAFIOS E PERSPETIVAS
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Foi com enorme prazer que aceitei o convite para presidir à sessão de abertura da II Conferência Internacional de Economia do ISCEE, subordinada ao tema CEDEAO: DESAFIOS E PERSPECTIVAS. Aproveito a oportunidade para expressar ao Senhor Professor Doutor JOSÉ AUGUSTO LOPES DA VEIGA, Presidente do Conselho de Administração do ISCEE, os meus agradecimentos pelo convite, e manifestar o quanto é gratificante poder estar aqui presente, num evento que diz respeito a uma comunidade de que Cabo Verde faz parte, desde 1977, e cuja situação, a todos os níveis, pode afetar e influenciar o desenvolvimento do país.
Esta Conferência reveste-se de grande importância e oportunidade, pelo programa e conteúdo, bem recheados, abrangendo, praticamente, todas as áreas relacionadas com o tema geral. Igualmente, é de se destacar o envolvimento da academia, no caso, o ISCEE, nessa discussão, assumindo, assim, um posicionamento claro sobre questões de relevância para a vida e para o funcionamento da CEDEAO. Com isso, o ISCEE adota e coloca o saber e o conhecimento científico produzido ao serviço das sociedades e dos estados membros da nossa comunidade sub-regional, indo ao encontro do papel fundamental que a academia é chamada a desempenhar no processo de desenvolvimento regional e nacional.
A CEDEAO, criada em 1975, tem como objetivo geral a promoção da cooperação económica e o desenvolvimento em todos os campos de atividade da sub-região oeste–africana. Tal inclui a livre circulação de pessoas, bens e serviços no espaço comunitário, a criação de uma tarifa exterior comum para as trocas comerciais extracomunitárias e a harmonização de políticas setoriais.
Composta por 15 países incrivelmente diversos, a CEDEAO cresceu institucionalmente e tem feito consideráveis avanços em vários dos domínios da sua atuação. Vive, todavia, momentos conturbados e complexos, que são reflexos do contexto geopolítico e geoestratégico da região e do continente africano. As ruturas constitucionais em quatro dos seus Estados membros, e o anúncio da saída do Burkina Faso, do Mali e do Níger da Comunidade, que, entretanto, criaram uma nova organização, a Aliança dos Estados do Sahel (AIS), vem complicar ainda mais a situação. O Presidente do Senegal Bassirou Diomaye Faye tem exercido o papel de mediador das difíceis e complexas negociações em curso entre a CEDEAO e esses países. Espero que consigamos alcançar resultados positivos e que se evite a saída desses países, o que traria consequências de todo imprevisíveis para a paz, a estabilidade e o desenvolvimento da região.
Aliás, tenho insistido, desde que assumi as minhas funções de Presidente da República, que para catalisar processos transformacionais do continente e ser ator relevante na arena internacional, a organização da União Africana (UA) terá de ser profundamente reformada, estabelecendo um sistema de governança multinível com a consequente divisão de trabalho entre a União, as organizações sub-regionais e os Estados. Um sistema de governança multinível levaria à redefinição do papel da CEDEAO, que, do meu ponto de vista, deve assumir uma missão essencialmente de integração económica, deixando as responsabilidades de paz e de segurança para a UA.
Uma das principais barreiras ao desenvolvimento económico dos países que compõem a CEDEAO é a falta de infraestruturas adequadas. Estradas precárias, energia intermitente e acesso limitado à água potável são apenas alguns dos desafios que a sub-região enfrenta. Sem investimentos significativos em infraestruturas, o crescimento económico será limitado e a capacidade de atrair investimentos estrangeiros ficará comprometida.
Igualmente, a fragilidade das instituições, a instabilidade política e os conflitos armados em algumas partes da sub-região oeste-africana representam sérias ameaças ao desenvolvimento.
Além disso, a crescente ameaça do terrorismo que se espalha do Sahel central para os países costeiros vem gerando impactos significativos, revertendo, praticamente, todos os ganhos de desenvolvimento da última década. Por outro lado, os ataques terroristas aumentam as necessidades humanitárias, criando demandas concorrentes com os investimentos sociais necessários para promover a resiliência e a igualdade de oportunidades.
É fundamental que trabalhemos juntos para promover a paz, a estabilidade, o Estado de Direito Democrático e o desenvolvimento. Para o efeito é necessário silenciar as armas e utilizar o conhecimento da academia e da sociedade civil para proporcionar respostas sustentáveis às mudanças que se impõem nessa sub-região, a fim de criar maiores oportunidades de crescimento económico, visando o bem-estar de todos.
Outro desafio importante que os Estados e a Comunidade económica enfrentam refere-se à diversificação da economia. Muitos países da CEDEAO dependem fortemente de um setor específico, como a agricultura ou a mineração, o que os torna vulneráveis a flutuações nos preços das commodities. Para garantir um crescimento económico mais robusto e sustentável, é crucial que esses países diversifiquem as suas economias e invistam em setores como a indústria, o turismo e as tecnologias informacionais.
Apesar desses desafios, há razões para otimismo em relação ao futuro económico da CEDEAO. A sub-região oeste-africana, tal qual toda a África, possui uma força de trabalho jovem e em crescimento, o que representa um enorme potencial de desenvolvimento. Ademais, a demanda por produtos e serviços africanos está em ascensão nos mercados globais, criando oportunidades para os países da região expandirem as suas exportações e fortalecerem as suas economias.
A integração regional também é fundamental para o desenvolvimento económico da África no seu todo. A CEDEAO e as outras organizações sub-regionais têm um papel crucial a desempenhar na promoção do comércio intrarregional, na facilitação de investimentos transfronteiriços e na coordenação de políticas económicas. Ao trabalharem juntos, os países africanos podem superar os desafios individuais e alcançar um crescimento económico mais amplo e inclusivo.
A CEDEAO aproxima-se do seu 50º aniversario em 2025. Este pode ser o momento e a oportunidade para a organização se reinventar, encetando uma reforma profunda, reforma essa que deverá ser precedida de debates e contribuições nacionais dos Estados membros. Trata-se de uma reforma, por um lado, para adequar a missão e o funcionamento da organização às mudanças em curso nas ordens regionais e mundial e, por outro lado, para acelerar a integração económica regional.
Esta reforma “refundadora” faria com que houvesse maior responsabilidade (accountability) por parte de cada um no cumprimento das regras comuns em prol do desenvolvimento económico, social e cultural dos povos dos países que compõem a organização comunitária.Os eventos marcantes da atualidade e as ameaças, presentes e potenciais, na cena internacional e na região, devem ensinar-nos que não poderá haver melhor momento para essa verdadeira revolução pacífica a nível da nossa comunidade sub-regional que o atual, na medida em que o mundo que nos espera num futuro breve poderá não ser nem mais pacifico, nem mais benevolente para com os nossos países.
Quanto ao nosso país, penso que existe consenso político relativamente à pertença geopolítica de Cabo Verde à região oeste-africana, reconhecendo as vantagens de uma integração regional competitiva. No entanto, esse reconhecimento seria maior se procurarmos maximizar os ganhos e minimizar as perdas. Para o efeito, é fundamental que Cabo Verde trabalhe no sentido da obtenção de tratamento diferenciado previsto no artigo 68.º do Tratado revisto em relação aos Estados insulares. Tal resolveria questões essenciais como, por exemplo, a taxa comunitária, a tarifa exterior comum, a mobilidade, a moeda e o acesso a financiamentos comunitários.
Devo ser claro: relativamente à nossa integração na CEDEAO já devíamos estar muito mais avançados. Cabo Verde terá tudo a ganhar se ancorar, efetivamente, a sua economia na região Oeste africana. Mais investimentos, mais cooperação económico empresarial, mais trocas comerciais, mais possibilidades de intercâmbio entre as universidades e as academias existente na sub-região, mais intercâmbio cultural e também a realização de projetos regionais que seriam benéficos para acelerar o ritmo de crescimento e desenvolvimento de Cabo Verde.
O 50.º aniversário da CEDEAO seria uma boa oportunidade para a concretização desse desiderato, até porque estaremos também a comemorar os nossos 50 anos e seria tempo de abrirmos novas avenidas e construirmos novas possibilidades de integração no espaço da CEDEAO.
Pensemos juntos o futuro da nossa organização comunitária oeste-africana e saibamos ultrapassar em conjunto os obstáculos com que ela se depara. Saliento que muitos desses obstáculos já estão há muito tempo identificados, aguardando por decisões políticas ou pela execução das medidas já adotadas pelos Estados membros.
Os desafios e as perspetivas da CEDEAO serão hoje debatidos neste importante evento. Devo felicitar o ISCEE pela sua ousadia e por esta cintilante iniciativa de trazer ao debate as perspetivas de desenvolvimento desta comunidade e os caminhos para reforçar a integração regional e a participação de Cabo Verde nesse espaço geoeconómico e geopolítico.
O programa da Conferência é muito rico e diversificado, cobrindo um amplo leque de matérias, todas importantes e de enorme atualidade.
Julgo que estão reunidas todas as condições para que esta Conferência, aqui na Praia e no Mindelo, propicie ótimos debates em torno de um tema que interessa a todos os países membros da CEDEAO e em que há muito caminho por desbravar, seja no plano teórico, seja na sua concretização prática. Estou certo de que irão ser dois dias muito proveitosos para todos.
Muito obrigado pela vossa atenção e votos de bom trabalho!