Mensagem de Sua Excelência o Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, por ocasião da classificação da Morna, Património Imaterial da Humanidade

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Palácio do Presidente da República, 11 de Dezembro de 2019

É com grande júbilo que recebemos a notícia de que a Morna é, a partir de agora, oficialmente, Património Imaterial da Humanidade, classificada pela UNESCO, ao lado de diversas outras expressões artísticas e culturais. É uma data histórica que vem coroar não apenas quem, desde a primeira hora, colocou no terreno a candidatura, e aqueles que deram continuidade a este verdadeiro desígnio nacional, mas também os milhares de músicos, compositores, intérpretes, cantadeiras, amantes e apaixonados por este estilo musical, nas ilhas, na diáspora ou mesmo nos diversos cantos do mundo, sem sequer entenderem uma palavra da nossa língua materna.
É um longo caminho, desde as cantadeiras da Boa Vista, aos trabalhadores portuários de São Vicente e suas vielas, às veredas frescas e brumosas da Brava, passando por aqueles que a transportaram nas maletas em veleiros, vapores, carruagens de comboios, voos de longo curso, nos nossos milhares de emigrantes que, em momentos de ansiedade e angústia, nela evocaram a terra abandonada e trazida, amores perdidos, nos seus diálogos e ‘respostas di segredo cu mar’, nas manhãs gélidas do Norte. É o reconhecimento oficial, pela UNESCO, do humanismo que esta nossa forma particular de expressão identitária encerra e como nela vimos navegando neste mar da nossa vida comum, enquanto povo e nação una.
Alguns antropólogos afirmam que as primeiras palavras proferidas pelos primeiros hominídeos foram em forma de canto, quando aquelas não haviam sido ainda criadas. Hoje ainda podemos encontrar esses resquícios em povos antigos, como nos aborígenes da Austrália, que ‘cantam’ o seu território e história, assim como os ‘griots’ africanos. A Morna também é a pauta das nossas vidas, os caminhos percorridos, o invólucro da nossa dor e alegria, a paleta dos nossos desejos e da nossa esperança. E esta distinção é também de grande júbilo para todo o povo cabo-verdiano, nas ilhas, mas sobretudo na diáspora, lá onde a Morna é sentida de forma muito própria, onde se assume como espaço imanente desse sentimento intrinsecamente da terra crioula.
Quero dar os meus parabéns a todas as equipas envolvidas neste processo, pelo sucesso obtido, e desejar que esta importante classificação possa contribuir para o aprofundamento do estudo da Morna, sua maior divulgação internacional, maior aprendizagem pelos mais jovens, e o desenvolvimento de todos os requisitos que resultam deste novo estatuto, para o bem da nossa música, da nossa cultura, e desta terra sonora que é Cabo Verde.

Jorge Carlos de Almeida Fonseca