DIscurso de Sua Excelência, o Presidente da República, por ocasião do 53º aniversário do Município de Santa Cruz

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Para mim, é sempre um prazer renovado, regressar ao Município de Santa Cruz, para tomar pulso às realizações e, igualmente, participar nas celebrações comemorativas de mais um aniversário da sua criação. Agradeço, pois, ao Senhor Presidente da Câmara Municipal, Dr. Carlos Alberto Silva, bem como ao Senhor Presidente da Assembleia Municipal, Dr. Gilson António Cardoso, por este honroso convite que me enche de satisfação por propiciar esta oportunidade de conciliar a formalidade e também o espaço para alguma confraternização.

Tenho reiterado todo o meu grande apreço pelas notáveis conquistas do Poder Local Democrático, decorridas mais de três décadas após a sua instauração. Por esta via e pelas suas escolhas, podem influenciar positivamente na resolução das questões respeitantes ao bem-estar e ao progresso económico e social das comunidades locais. Os ganhos relacionados com um exercício muito mais próximo da Democracia, através da escolha pelas populações dos seus representantes, podem, em certos casos, inspirar aqueles que disputam o poder a nível nacional.  O vigor democrático ganha expressão, por exemplo, no leque de soluções já ensaiadas nas eleições municipais, e que ainda sequer foram experimentadas a nível nacional.

Merece destaque, igualmente, o facto de as populações, das ilhas e municípios que mais sofrem com a insularidade e o encravamento, registarem progressos assinaláveis, graças às virtualidades do municipalismo. Este desenvolvimento económico e social é evidente, em todos os cantos do território nacional, apesar da constatação de que ainda persistem muitas demandas que precisam ser atendidas.

Estão patentes em Santa Cruz os benefícios do municipalismo e nota-se uma visão clara do desenvolvimento, que merece ser enaltecido. As minhas congratulações à população e a esta dinâmica equipa liderada pelo Dr. Carlos Alberto Silva! Hoje, o município tem mais visibilidade, tornou-se mais atrativo para o investimento privado, e é mais competitivo. A requalificação urbana conferiu outro rosto à cidade. As obras em curso, no âmbito do Programa de Mobilização de Água para a Agricultura, através da dessalinização, abrem boas perspetivas para a expansão da área irrigada, bem como o aumento da produção e maior quantidade de água disponível.

Apesar dos progressos já alcançados, Santa Cruz ainda enfrenta desafios no seu processo de desenvolvimento, para atender às legítimas expectativas das populações, que são cada vez mais elevadas, aliás, como nos demais municípios do país. Há que criar condições para que haja mais empregos, menos pobreza e menos desigualdade. É necessário mais investimento público, nomeadamente, nos setores da saúde, educação, água e saneamento, acessibilidades, com vista à melhoria da qualidade de vida das pessoas.

Vejo necessidade de se transferir mais poderes e mais recursos para as ilhas e os municípios. Assim, esta edilidade, por exemplo, teria melhores condições para prosseguir com os trabalhos de requalificação urbana, investir em energias limpas e na produção e distribuição de água, na habitação, no fomento de micro e pequenas empresas, no crescimento do turismo e do agronegócio, contribuindo, desta forma, para o aumento da competitividade local, da produtividade e para a atração de mais investimentos privados.

Há muitos problemas insulares e municipais, cujo processo de resolução arrasta-se há anos, que já estariam equacionados e solucionados, se a nível de cada ilha ou município houvesse recursos e poderes para os encaminhar. Estaremos a crescer abaixo do nosso potencial se não tivermos presente a necessidade de muito mais ambição e ousadia na descentralização política.

Este Município é rico em potencialidades que reclamam por uma exploração mais abrangente. Na área da cultura, e da música em particular, o já institucionalizado certame “1 Concelho 3 Ritmos” deve servir de exemplo para outras iniciativas similares ou estimular experiências em atividades com capacidades ainda subaproveitadas. Refiro-me ao turismo, tanto de praia como de montanha; agropecuária; pesca e indústria agroalimentar, de entre outras aptidões.

Em geral, e depois de palmilhado um rico caminho de trinta e três anos do municipalismo em Cabo Verde, muitas ilações podem ser tiradas desse percurso, sugerindo-nos melhorias e correções de rota. O balanço é largamente positivo, mas urge redesenhar as políticas públicas, apostar nos investimentos sociais e na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Hoje enfrentamos novos desafios e uma atitude avisada seria evitar resolvê-los com soluções pretéritas, ou seja, devemos estar recetivos a inovações e mudanças.

É fundamental ser mais rápido e eficaz, modernizando a gestão municipal, melhorando a qualidade da Administração e colocando o acento tónico na transparência e na prestação de contas. Esta estratégia evita bloqueios e tem como fito garantir uma entrega de mais rendimentos e a satisfação das necessidades básicas em todos os municípios, e à escala nacional.

Volto a enfatizar que é cada vez mais premente conjugar mais poder, mais recursos para o Poder Local, melhor fiscalização e mais responsabilidade fiscal. Há que prestar atenção ao endividamento, que deve manter-se dentro de limites que não ponham em causa a sustentabilidade dos municípios. E é exigível que quando ocorram prevaricações, elas sejam penalizadas.

É cada vez mais inadiável que se caminhe para uma nova fase de Descentralização, que supere o estágio atual, com ambição e ousadia, repito. Face aos persistentes constrangimentos nas conetividades entre as ilhas, temos que inverter a situação e reforçar a coesão territorial, garantindo o concurso de todas as ilhas e Municípios no processo de desenvolvimento económico e social do arquipélago. Renovo, de forma insistente, que é preciso aprovar o Novo Estatuto dos Municípios, bem como a Nova Lei das Finanças Locais.

Há uma farta gama de evidências de que devemos garantir uma gestão estratégica dos solos, que são recursos muito escassos e, por isso, requerem uma gestão muito criteriosa, através de um planeamento e ordenamento adequado do território, com as áreas bem definidas e respeitadas, em se tratando da alienação de solos. A Lei da Responsabilidade Territorial deve penalizar aqueles que, atropelando o processo legal, prevaricarem na gestão dos solos.

Ainda neste ano, os cabo-verdianos serão chamados às urnas para a escolha livre dos seus representantes a nível municipal. Espera-se que, em nome dos interesses superiores das ilhas e dos municípios, essa oportunidade não seja aproveitada para imediatismos e calculismos, capazes de sabotar os genuínos interesses das populações.

Espero que com estas eleições o país entre numa nova fase de relacionamento entre o Estado e as Autarquias Locais. Relações baseadas na lealdade constitucional e no respeito mútuo. As competências do poder local devem ser honradas e os municípios tratados de modo justo e transparente pelo Estado. Este não tem legitimidade para discriminar ou desconsiderar a autonomia dos municípios e a escolha livre dos seus cidadãos.

Estamos no mês de março e, hoje, dia 27, comemoramos o Dia da Mulher Cabo-verdiana. Temos de aproveitar a ocasião para homenagear todas as mulheres cabo-verdianas. Mas também esta circunstância é igualmente propícia para a reflexão sobre uma emergência que a nossa sociedade vem enfrentando. Daí manifestarmos o nosso mais veemente repúdio às agressões sexuais, à violência baseada no género e ao feminicídio, fenómenos que só nos envergonham. As estatísticas revelam uma tragédia em curso, à frente dos nos olhos. Há que dar um basta a esta dor, proteger as nossas mulheres face àqueles que não manifestam nenhum apreço pelas suas vidas!

Enquanto houver desigualdades, irá persistir o problema de género e outras vulnerabilidades, em todos os espaços da vida económica, social e política. A via que nos permitirá ultrapassar as agruras que ainda vitimam as nossas mulheres, passa por mais investimento na educação, na saúde e segurança social, por menos pobreza e menos exclusão. Definitivamente, precisamos de muito mais igualdade de género na distribuição do poder político. De mais crescimento, de mais inclusão, de mais oportunidades e de mais rendimentos para todos.  Só assim será possível trilhar o caminho da realização dos direitos e aspirações dos cabo-verdianos e, consequentemente, destas cidadãs batalhadoras e resilientes, com vista à concretização dos seus sonhos mais legítimos.

Termino, agradecendo pelo convite que me permitiu participar nesta cerimónia comemorativa do 53º aniversário do Município, desejando progressos e mais desenvolvimento para Santa Cruz. Neste dia da Mulher Cabo-verdiana, o meu apelo final é no sentido de seguirmos juntos, num compromisso inequívoco de sermos mais tolerantes, e cultivemos a harmonia e o respeito dentro das famílias e entre todos os cidadãos, na certeza de que com esta atitude, toda a sociedade sairá a ganhar.

Muito obrigado!