Discurso de Sua Excia. Presidente da República, por ocasião do X Congresso da ANMCV

86

Excelências,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

É com grande satisfação que felicito os recém-empossados órgãos da Associação Nacional dos Municípios de Cabo Verde. Estendo as minhas felicitações a todos os eleitos para o mandato de 2024-2028, augurando-lhes pleno êxito nesta missão em prol do municipalismo cabo-verdiano, com o reforço da democracia e a formação de políticas públicas orientadas para a realização dos direitos económicos, sociais e culturais, a redução das dissimetrias regionais e o combate consistente e sustentável à pobreza e às desigualdades sociais.

Dirijo um reconhecimento especial ao Senhor Presidente do Conselho Diretivo cessante, Dr. Herménio Fernandes, e à Senhora Presidente do Conselho Geral cessante, Dra. Clara Marques, pela dedicação com que serviram esta Associação e pelo convite que me dirigiram para presidir à cerimónia de encerramento deste X Congresso. Enalteço o elevado nível dos debates e a profícua troca de ideias ocorrida ao longo dos trabalhos, testemunho inequívoco da vitalidade e do dinamismo da ANMCV.

No cinquentenário da Independência Nacional, importa reiterar que o Poder Local se afirma como um dos pilares estruturantes do nosso Estrado de Direito Democrático. Os municípios têm sido agentes catalisadores do desenvolvimento local, protagonistas na consolidação da democracia, abrindo espaços de participação cidadã e da sociedade civil na governança pública.

Decorridas mais de três décadas de municipalismo, assiste-se ao avigoramento de paradigmas que se traduzem na mobilização eficaz de recursos institucionais, financeiros e humanos e na formação de políticas públicas ajustadas às especificidades locais, gerando impactos tangíveis no progresso socioeconómico do país. A regularidade das eleições autárquicas e a fluidez da alternância democrática atestam a maturidade do nosso sistema de governação local.

O municipalismo tem sido um instrumento fundamental na promoção do progresso e na redução das desigualdades regionais. Os municípios, apesar de ritmos de desenvolvimento distintos, têm contribuído para a diversificação da economia, a valorização dos recursos endógenos e a modernização das infraestruturas. Vêm desempenhando um papel importante na preservação e promoção da identidade cultural e do património local. Refiro-me à organização de eventos culturais, à recuperação de edifícios com valor patrimonial e à valorização das tradições locais. Hoje, o turismo cultural começa a ser uma realidade, muito pelo impulso das câmaras municipais.

Contudo, desafios persistem. A dependência financeira das autarquias em relação ao governo limita a sua autonomia e capacidade de investimento. A escassez de recursos humanos qualificados compromete a eficácia da administração local. A melhoria da gestão e da transparência é imperativa para prevenir práticas ineficientes e fortalecer o controlo social. Como é evidente, quanto melhor for a articulação entre os poderes Local e central e se clarificarem as competências, mais se evitará sobreposições, duplicação de esforços e desperdício de recursos. A coordenação garantirá a eficiência na prestação de serviços públicos e impedirá a fragmentação de políticas. Depois de três décadas de vigência do municipalismo, verificamos que, nestes e noutros aspetos, persistem desafios, pelo que há margem para superarmos o desempenho atual.

A descentralização administrativa e financeira deve avançar de forma célere e eficaz, garantindo que a transferência de competências seja acompanhada dos correspondentes recursos financeiros e humanos. Defendemos, por isso, a criação de um Fundo de Desenvolvimento Local e Regional, sustentado por receitas dos Fundos de Manutenção Rodoviária, Turismo e Ambiente, complementadas por dotações do Fundo de Financiamento Municipal e outras fontes de financiamento externo.

A sustentabilidade financeira dos municípios exige a diversificação das suas fontes de receita. Devemos otimizar a arrecadação de impostos locais, conceber incentivos fiscais para atrair empresas e investimentos privados e promover o empreendedorismo económico, social e cultural. Urge, igualmente, reforçar políticas públicas de coesão territorial, no quadro de um mais adequado e eficiente aproveitamento das potencialidades locais e regionais.

35 anos após a instalação de um poder local democrático, é tempo de ousarmos mais descentralização, transferindo mais poderes e mais recursos às ilhas e aos municípios, englobando as autarquias locais, as ONGs, as associações de desenvolvimento comunitário, as universidades, as empresas e outras iniciativas da sociedade civil. Num quadro de complementaridade e subsidiariedade, podemos criar mais dinámicas de crescimento e construir fatores de competitividade, com benefícios para o emprego e a melhoria dos rendimentos das famílias e da qualidade de vida das pessoas.

O futuro do Poder Local reclama reformas estruturantes, designadamente a revisão da Lei das Finanças Locais, de modo a clarificar competências, reforçar a autonomia municipal e consolidar mecanismos de financiamento sustentáveis. Paralelamente, deve aprofundar-se o escrutínio da governação local, assegurando um rigoroso controlo da despesa pública e promovendo uma gestão criteriosa de o património público, designadamente os solos, que são recursos estratégicos para o desenvolvimento durável de um país arquipélago, tal que Cabo Verde.

A capacitação dos recursos humanos municipais deve assumir-se como prioridade estratégica. Atrair e fixar profissionais altamente qualificados nos municípios será determinante para garantir uma gestão eficaz e potenciar o investimento. Devemos, igualmente, fomentar mecanismos de participação cívica, assegurando que as decisões municipais reflitam as aspirações da população.

Um outro domínio onde as transformações são essenciais é o da definição dos recursos institucionais das autarquias locais, para que as estruturas organizacionais respondam com mais eficácia aos reptos dos novos disruptivos tempos e às demandas e exigências dos cidadãos e da sociedade civil. Penso que os municípios devem passar por uma revolução de gestão, uma verdadeira reengenharia organizacional, para cobrir novas áreas de intervenção como a formação profissional, o fomento empresarial e a promoção de investimentos, a densificação do tecido produtivo, a construção de fatores de competitividade, a geração de empregos, a proteção das famílias, o combate à pobreza e às desigualdades sociais.

O municipalismo constitui um esteio incontornável da democracia cabo-verdiana e um motor insubstituível do desenvolvimento sustentável. Com um compromisso inabalável para com a descentralização, a boa governação e a transparência, poderemos edificar municípios mais robustos, resilientes e preparados para os desafios do futuro.

Declaro encerrado o X Congresso da Associação Nacional dos Municípios de Cabo Verde.

Muito obrigado!