O Presidente da República, José Maria Neves, advogou, esta manhã, uma “discriminação a favor” do Município de Ribeira Grande de Santiago, enquanto Património Histórico da Humanidade, que justifica com os “custos” dessa condição e a necessidade de se preservar o sítio histórico.
José Maria Neves fez esta e outras considerações durante a sua intervenção no ato solene das comemorações do Dia do Município da Ribeira Grande de Santiago, refletindo sobre a relevância do passado histórico, os ganhos do presente e a projetar o futuro do município, de acordo com a ambição das suas gentes.
Ribeira Grande de Santiago, Berço da Nação cabo-verdiana, lembra Neves, “é, muito justamente, Património Mundial da Humanidade”. Porém, chama a atenção o Chefe de Estado, tratar-se-á de uma distinção “que, como é óbvio, compreende vantagens e custos. Os custos estão essencialmente relacionados com as restrições impostas às edificações dentro do Sítio Histórico e com a restauração e preservação do património construído. São os chamados “Custos de Patrimonialidade”.
Nisso, “por esta razão, advogo uma discriminação a favor deste Município, de forma a conseguir mitigar os efeitos das restrições e criar novas oportunidades de crescimento económico, de criação de emprego e de melhoria da qualidade de vida dos seus habitantes”, conclui o Presidente.
Assim, José Maria Neves sugere uma “compensação” através da conjugação com o Estatuto Especial do Património, “com os esforços com vista a preservar o sítio Património Mundial da Humanidade, estaríamos perante um casamento perfeito. É de reconhecer tratar-se de uma grande empreitada e uma grande ambição, para um município desta dimensão, quando estão em causa as tão sonhadas obras de remodelação da Sé Catedral, a requalificação do Sítio Histórico, ou outras intervenções sempre necessárias, de reparações ou de conservação, e que demandam um saber muito especializado”.
Para que este Sítio Histórico seja cada vez mais atrativo, sugere o Chefe de Estado, “deve ser apetrechado de equipamentos sociais e culturais que respondam adequadamente à demanda atual e à prevista a curto e médio prazos”, exemplificando com o Centro Cultural local. Este sugere ainda um futuro Museu Cultural.
Neves prevê ainda a recuperação da Sé Catedral no horizonte de 2033, altura em que completa 500 anos da criação da Diocese de Santiago de Cabo Verde.
O Presidente considera igualmente importante para a promoção da Cidade e do país, a realização, neste Município, de um Encontro Internacional das Cidades de Santiago. “Do mesmo passo, proponho que se recrie, a partir desta Cidade, em cooperação com o Governo e outros municípios de Santiago, as Rotas dos Escravos na Ilha”, são algumas das propostas do Chefe de Estado que pode conferir na leitura, na íntegra, do discurso de Sua Excia., o Presidente da República, a seguir:
DISCURSO DE SUA EXECELÊNCIA, O SENHOR PRESIDENTE DA
REPÚBLICA DE CABO VERDE, DR. JOSÉ MARIA NEVES NA SESSÃO SOLENE DO DIA DO MUNICÍPIO DE RIBEIRA GRANDE DE SANTIAGO
SALA DE CONFERÊNCIAS DO HOTEL VULCÃO – CIDADE VELHA,
31 DE JANEIRO DE 2022
Ilustres Convidados,
Minhas Senhoras e meus Senhores,
É com enorme prazer que acolhi o amável convite de Ribeira Grande de Santiago para presidir a esta Sessão Solene do dia do Município. Saúdo e agradeço o Senhor Presidente da Câmara Municipal e o senhor Presidente da Assembleia Municipal pelo convite.
A satisfação ainda é mais redobrada por esta celebração acontecer no Berço da Nação caboverdiana e pela carga simbólica que isso significa. Ribeira Grande e a Cidade de Santiago carregam um passado de glória, vivem um presente de luta e de desafios e aspiram a um futuro de maior desenvolvimento para todas as suas filhas e todos os seus filhos.
Foi neste espaço que se fundiram povos e culturas; se climatizaram plantas e animais; se misturaram línguas e técnicas, numa mestiçagem que o mundo jamais assistira. E é neste centro da Cultura cabo-verdiana que sucedeu, ainda nos seus primórdios, a maior de todas as invenções: a nossa língua materna, o crioulo!
Aproveito esta oportunidade para saudar com simpatia e amizade, os munícipes residentes e felicitar, também, muito calorosamente, os ribeira-grandenses que vivem na diáspora.
Em boa hora Ribeira Grande recuperou o seu estatuto de Município – foi, aliás, o primeiro de Cabo Verde – e Santiago recuperou o seu estatuto de Cidade. Os ganhos são por demais evidentes no que toca à valorização do espaço, história e a memória, ao reforço da democracia local e à afirmação do Estado de Direito Democrático.
É também inegável o contributo da autarquia local, como um forte pilar no processo de transformação socioeconómica, correspondendo com relativo sucesso às expectativas de bem-estar e de progresso da comunidade de Ribeira Grande.
Infelizmente, nem sempre é possível dar resposta a todas as legítimas aspirações das populações e esta realidade torna-se mais evidente quando ocorrem situações adversas como tem sido os sucessivos anos de seca e, ultimamente, a pandemia da Covid-19, com todas as suas consequências socioeconómicas. Ribeira Grande não foge à regra.
Com uma população muito jovem, em que a idade média é inferior a trinta anos, a recessão económica por que passa o país, tem uma incidência maior nesta camada, com o desemprego jovem a rondar os 15%. Trata-se de uma realidade que carece de uma atenção especial com vista a alterar a situação, proporcionando maior empregabilidade aos jovens do Município.
Assim, a qualificação dos recursos humanos deve orientar-se para o aproveitamento das potencialidades, das necessidades e das oportunidades emergentes do processo de desenvolvimento local e regional.
Estou a pensar em áreas de formação relacionadas com o turismo e afins, restauração e conservação do património construído, agricultura, pescas, pecuária, indústria agroalimentar, entre outras. Um maior engajamento da comunidade local na preservação do Sítio Histórico, através da criação de projetos de fomento de empreendedorismo cultural e de dinamização cultural, voltados sobretudo para jovens e mulheres chefes de família, seria igualmente uma boa aposta, quando se regista uma significativa taxa de desemprego jovem e feminino.
Não temos dúvidas de que o combate à pobreza e ao desemprego, a nível nacional, e neste Município, em particular, constitui uma prioridade. Prioridade para o Poder Local, prioridade para o Governo da República, prioridade para a sociedade cabo-verdiana.
Na primeira linha do combate à pobreza está a criação de empregos. Sublinho que é fundamental que o emprego seja assumido como um desígnio nacional pelo Estado, pelos partidos políticos, pelos municípios, pelos sindicatos, pelas empresas, pelas ONG`s e pelas famílias.
A presente conjuntura, ainda fortemente marcada pelos efeitos da pandemia, comporta algumas variáveis que podemos controlar e influenciar a nosso favor. É o caso da taxa de vacinação contra a Covid-19. Os dados são ótimos, mas sempre é possível fazer melhor, principalmente em relação aos adolescentes que, iniciando mais tarde, espera-se que venham a ter, brevemente, a mesma percentagem de cobertura da população adulta, bastando para tal uma forte adesão à campanha de vacinação.
Com todos os munícipes empenhados no esforço de uma ampla imunização e no cumprimento de todas as medidas preventivas recomendadas pelas autoridades sanitárias, estaremos a garantir melhores condições de saúde, um regresso mais célere à normalidade e, consequentemente, a retoma económica será mais rápida. A atitude, de cidadania, é individual, mas toda a comunidade sairá beneficiada.
Ribeira Grande de Santiago, Berço da Nação cabo-verdiana é, muito justamente, Património Mundial da Humanidade. Uma distinção que, como é óbvio, compreende vantagens e custos. Os custos estão essencialmente relacionados com as restrições impostas às edificações dentro do Sítio Histórico e com a restauração e preservação do património construído. São os chamados “Custos de Patrimonialidade”. Por esta razão, advogo uma discriminação a favor deste Município, de forma a conseguir mitigar os efeitos das restrições e criar novas oportunidades de crescimento económico, de criação de emprego e de melhoria da qualidade de vida dos seus habitantes.
Se conjugarmos uma certa compensação, através do Estatuto Especial do Património, com os esforços com vista a preservar o sítio Património Mundial da Humanidade, estaríamos perante um casamento perfeito. É de reconhecer tratar-se de uma grande empreitada e uma grande ambição, para um município desta dimensão, quando estão em causa as tão sonhadas obras de remodelação da Sé Catedral, a requalificação do Sítio Histórico, ou outras intervenções sempre necessárias, de reparações ou de conservação, e que demandam um saber muito especializado.
Paralelamente, e quando se deseja um incremento do número de visitantes, há necessidades que se tornam prementes, como parece ser o caso de um Museu Cultural. Outros espaços, existentes, já se revelam acanhados, como é o caso do Centro Cultural, facto que pudemos constatar há poucas semanas, por ocasião da realização de uma atividade conjunta envolvendo a Presidência da República e esta Câmara Municipal.
Para que este Sítio Histórico seja cada vez mais atrativo, deve ser apetrechado de equipamentos sociais e culturais que respondam adequadamente à demanda atual e à prevista a curto e médio prazos.
Considero ser importante para a promoção da Cidade e de Cabo Verde, a realização, neste Município, de um Encontro Internacional das Cidades de Santiago. Do mesmo passo, proponho que se recrie, a partir desta Cidade, em cooperação com o Governo e outros municípios de Santiago, as Rotas dos Escravos na Ilha.
Por outro lado, em 2033, serão comemorados os 500 anos da criação da Diocese de Santiago de Cabo Verde, que abrangia, na altura, vastos territórios da costa ocidental africana. No que se refere à Cidade de Santiago, é essencial que, em estreita articulação com o Governo e a Diocese, seja elaborado um plano das comemorações, para que, em 2033, nesse âmbito, se tenha a Sé Catedral reabilitada, as igrejas e outros edifícios religiosos identificados e a execução da expansão urbana da Cidade em curso.
Por certo, o facto de esta Sessão Solene não se realizar nos Paços do Concelho, pode ser também significativo da exiguidade de espaço da sede do Município. Na verdade, é a própria cidade que já clama pelo arranque da expansão para uma nova área, com vista a aliviar a pressão sobre a zona classificada de Património Mundial. Isto a par ainda com a melhoria de algumas acessibilidades visando o desencravamento e a aproximação das localidades mais distantes.
Para estes desafios, é essencial diversificar as parcerias, as cooperações, as geminações, estabelecer intercâmbios e promover complementaridades, tudo com o fito de alçar o Município da Ribeira Grande de Santiago a um patamar a que tem direito.
O resultado da cooperação com o Reino de Espanha, com Portugal, ou com Universidades estrangeiras no domínio da arqueologia, tem dado bons frutos. Há, pois, que prosseguir nessa senda, e com imaginação, para se conseguir o concurso de parceiros públicos ou privados, com o propósito de trazer mais investimentos, capazes de propiciar um maior desenvolvimento ao Município.
Se é verdade que a Ribeira Grande de Santiago conheceu, no passado, o seu apogeu, a que se seguiu o declínio, fruto de vicissitudes históricas, de há muito que a cidade, hoje Património Mundial da Humanidade e uma das Sete Maravilhas do Mundo de origem Portuguesa, acordou dessa longa letargia e tem dado sinais de vitalidade que devem ser valorizadas, acarinhadas e apoiadas.
Este Município tem ambição e eu confio na sua capacidade para enfrentar com sucesso os próximos desafios, prosseguindo a sua caminhada na estrada do desenvolvimento e do progresso, para satisfação de todos os ribeira-grandenses e de Cabo Verde em geral.
Finalmente, os meus votos de muitos sucessos ao Município de Ribeira Grande de Santiago e os desejos sinceros de que estejamos a caminhar para o fim da pandemia, o que augura um futuro de retoma e de maiores progressos para todos.
Muito obrigado!