Discurso do Presidente da República de Cabo Verde, Sua Excelência Dr. Jorge Carlos de Almeida Fonseca por ocasião da 5ª Edição do Festival do Café do Fogo
Mosteiros, 23 de Março de 2018
“É com muito gosto que participo na abertura desta 5ª edição do Festival do Café do Fogo, aqui no Concelho dos Mosteiros, e que traz a esta bela região convidados de várias paragens. O prazer será, tenho a certeza, por também poder participar em algumas – e acompanhar outras – das actividades que fazem parte deste rico programa apresentado pela Câmara Municipal.
Durante estes dois dias, sei que iremos ter conferências, exposição de pintura, feira de café, eventos desportivos, como a corrida do café, concurso de poesia e ainda um grande espectáculo musical, coroando este ambiente de festa e, como todos esperamos, de sã convivência. Estamos, assim, num período que marca a cultura do café, que é o da colheita; uma época em que se colhe o fruto de muitos dias de labor e dedicação, em que os homens e mulheres que abraçam esta cultura veem o resultado do seu trabalho, num sentimento de felicidade e regozijo, e que acompanha a humanidade, desde os seus primeiros passos.
A aposta e a valorização da cultura do café, que vem sendo levada a cabo neste Concelho dos Mosteiros, é uma prova daquilo que poderá ser feito no sector agrícola, de acordo com as especificidades de cada uma das ilhas ou de cada região do nosso país. É sabido como este produto, em particular, suscita cada vez mais interesse no mercado internacional. E é a própria FAO, Fundo das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação a revelar, em seus estudos, o potencial das características deste café, e as suas possibilidades de sucesso em mercados exigentes, como o europeu. Tal significa que, no que respeita ao critério decisivo das condições naturais e resultados qualitativos, estamos no bom caminho, faltando apenas a aposta no fortalecimento da capacidade técnica dos nossos produtores e no aprimoramento da rede de venda e exportação.
Aliás, esta é a recomendação que o saudoso agrónomo cabo-verdiano, filho desta Ilha, Luís Augusto Grandvaux Barbosa, nos deixou quando, com saudade, nos lembrou dos tempos áureos em que se exportava o café do Fogo para a Síria e que, nos palácios europeus, se servia café da Ilha com uma etiqueta “café do Fogo” assinalando aos convidados o privilégio que estavam tendo ao apreciar. Na verdade, nos anos sessenta, a exportação do Café Arábica deu à Ilha do Fogo uma relevância na economia da Província.
O café, produto que nós todos praticamente consumimos todos os dias, é cultivado nas nossas ilhas há pelo menos 200 anos. Basta recordarmos que o Morgadio de Monte Queimado, a maior propriedade unificada de produção de café na ilha do Fogo (situado aqui nos Mosteiros), foi já contemplada, por diversas vezes, com prémios internacionais, tendo mesmo arrecadado a Medalha de Ouro da Exposição Colonial no Porto, em 1934, produzindo aquele que foi considerado, na época, “O melhor café do Império”.
No Fogo (nas zonas húmidas aqui de Mosteiros), em Santiago, Santo Antão, S. Nicolau e na Brava, muitas foram as famílias que, ao longo dos tempos, cultivaram os seus cafezais, cujo café foi sempre muito procurado e apreciado. Ou seja, Cabo Verde foi sempre conhecido pela qualidade do seu café, e como tendo um dos melhores do mundo. Mas durante muitos anos, foi com muita tristeza que vimos envelhecer os cafezais de algumas das nossas ilhas, chegando mesmo, em alguns dos casos, a desaparecer por completo. Mas hoje, renovamos a esperança com exemplos como o dos Mosteiros, onde está vincada esta aptidão natural para o cultivo do café. Fazemos votos para que as novas gerações possam descobrir o quão útil e lucrativa esta actividade pode ser, e os benefícios que dela poderão resultar para a região, para a ilha e para o país, de uma forma geral.
O futuro passa, assim, pela recuperação e dinamização da produção do café em todas as regiões onde existe esse potencial, numa articulação com todos os agentes envolvidos, económicos e públicos. Só assim se poderá aumentar a competitividade e relançar uma produção que já foi mais pujante, mas que ainda tem muito para dar e representar um ganho significativo na balança comercial do nosso país.
A filosofia subjacente à realização do Festival do Café do Fogo é a sua valorização e promoção na perspectiva do reforço da sua internacionalização.
Convém ressaltar que essa perspectiva tem sido concretizada numa óptica que ultrapassa, de longe, uma visão meramente economicista.
Na verdade, é muito salutar registar a preocupação de fazer do produto um importante elo de ligação a actividades culturais que podem, ou não, ter uma relação directa com o café.
Associar a dança, a música, o teatro, a gastronomia, o desporto, a poesia ao festival, consubstancia uma visão abrangente que, através da cultura e do desporto, procura envolver as diferentes faixas etárias da sociedade, num projecto no qual, por razões diferentes, todos se podem reconhecer.
Merece referência muito especial a mobilização, através da escola, das crianças e jovens por meio da poesia.
Por essa via, desperta-se nos mais novos o interesse por esse emblemático produto, garante-se alguma fidelização e contribui-se para desenvolver o gosto pela leitura e a criatividade. Talvez não fosse descabido estender essa actividade a todos os alunos da ilha.
Saúdo, assim, as autoridades camarárias que, desde 2014, vêm levando a cabo este evento importante para a região e para o país, e que se tornou numa oportunidade única para reunir, à volta do café, produtores, empresários, proprietários, consumidores, exportadores, especialistas na área, cidadãos anónimos e muita gente do desporto e da cultura.
Celebrar o café é celebrar Cabo Verde, celebrar as suas gentes trabalhadoras, celebrar o ciclo da vida e celebrar o futuro.
Um excelente Festival do Café do Fogo, a todos”.