Discurso proferido por S.E. o Presidente da República, Dr. Jorge Carlos de Almeida Fonseca, por ocasião de posse do novo Presidente e demais Juízes Conselheiros do Tribunal de Contas

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Palácio do Presidente da República- Salão Nobre

13 de Novembro de 2018

Com a nomeação do novo Presidente e dos novos Juízes do Tribunal de Contas, termina o mandato dos Juízes Sr. Dr. José Carlos Delgado (Presidente) Sr. Dr. Horácio Fernandes e Sr. Dr. José Pedro Delgado.
Nesta oportunidade, é devida uma palavra de reconhecimento aos Juízes cessantes, em especial ao Juiz Presidente Sr. Dr. José Carlos Delgado, pela dedicação aos cargos e à causa, e pelo notório desempenho no sentido da afirmação do papel do Tribunal de Contas no nosso ordenamento e na nossa realidade.

No decurso da sua evolução, o órgão supremo do controlo dos fundos públicos foi qualificado, em alguns Países, como uma autoridade administrativa, seja devido ao caracter não jurisdicional de algumas das suas principais atribuições, seja por causa das suas ligações funcionais ao Parlamento ou ao Governo.

De um lado, os poderes de controlo de legalidade cometidos ao Tribunal de Contas inserem-se num quadro jurisdicional, e exercem-se em função de parâmetros e critérios jurídicos, extraídos de regras constitucionais, legais e contabilísticas.

Diferentemente, as competências relativas ao controlo da gestão financeira, exercidas através da avaliação da racionalidade económica das decisões de gestores de fundos públicos, fazem apelo a critérios de eficiência e de oportunidade, que se não integram no universo jurisdicional.

As modernas tendências vão no sentido de vincar o carácter jurisdicional do Tribunal de Contas, apesar de, como sublinhado, essa entidade assegurar também o desempenho de importantes funções que não se reconduzem à esfera jurisdicional.

Seguindo essa orientação, a Constituição da República de Cabo Verde integra o Tribunal de Contas no Capítulo dedicado à organização dos Tribunais, concebendo-o como “o órgão supremo de fiscalização da legalidade das despesas públicas e de julgamento das contas que a lei mandar submeter-lhes”.

O Tribunal de Contas é, assim, um Tribunal independente, como os demais Tribunais, sem qualquer subordinação ou ligação ao Governo ou ao Parlamento.

Na mesma linha, os Juízes que compõem o Tribunal de Contas são independentes, com a consequente inamovibilidade, insubstituibilidade e inviolabilidade típicas dos magistrados judiciais.

O estatuto jurídico-constitucional do Tribunal de Contas e as garantias de independência dos seus Juízes constituem factores de credibilidade e de confiança relativamente ao desempenho do órgão supremo do controlo dos fundos públicos.

Os juízes ora empossados exercerão as suas funções em conformidade com legislação recentemente aprovada (a Lei nº24/IX/ de 2 de Fevereiro), e há muito aguardada, atendendo à evolução dos tempos e aos novos desafios, para os quais a legislação anterior não estava preparada.

A lei ora vigente contempla um âmbito subjectivo alargado, que inclui não só as entidades públicas, como também entidades privadas que lidem com fundos públicos, o que é corolário de uma orientação correcta: a jurisdição do Tribunal de Contas deve potencialmente atingir toda e qualquer aplicação de fundos públicos, independentemente dos moldes formais em que se concretize.

As competências cometidas pela lei ao Tribunal de Contas, quer ao nível das modalidades do Controlo Financeiro (Fiscalização Prévia, Fiscalização Concomitante e Fiscalização Sucessiva), quer no plano das Responsabilidades Financeiras (Reintegratória e Sancionatória), traduzem-se em enormes desafios e responsabilidades.

No caso particular da fiscalização prévia, em que o legítimo objectivo de evitar a consumação de ilegalidades se confronta com a necessidade de celeridade e eficácia na satisfação das necessidades públicas a que se destinam os actos e contratos submetidos a essa fiscalização, a lei prevê o efeito de visto tácito se não tiver havido recusa de visto num prazo de 30 dias.

Perante o volume de solicitações de visto prévio relativamente a actos e contratos, provenientes de todas as entidades a ele sujeitas, o Tribunal de Contas apenas será capaz de decidir em 30 dias se for dotado de meios humanos especializados e altamente preparados, que viabilizem a análise e a tomada de decisão nesse prazo, com a devida ponderação.

A fiscalização sucessiva assegurada pelo Tribunal de Contas, a que estão sujeitas várias Entidades, inclui não só o controlo da legalidade, como também a avaliação da gestão financeira, em que se aprecia a economicidade e a eficiência das decisões dos responsáveis, o que também requer a devida capacitação das estruturas do Tribunal de Contas.

Nesta dimensão, o Tribunal de Contas assume um papel de enorme relevância quanto à gestão da coisa pública, seja pelo efeito indutor de boas decisões que a possibilidade de avaliação gera, seja pelo carácter pedagógico das intervenções do Tribunal de Contas junto das entidades fiscalizadas, e ainda pela divulgação pública da sua actividade, que proporcionará à comunidade uma percepção relativamente à capacidade de gestão patenteada pelos responsáveis das entidades fiscalizadas.

Igualmente importantes são os processos jurisdicionais de efectivação da responsabilidade financeira, no âmbito dos quais devem ser observadas todas as garantias que o Estado de Direito proporciona aos visados, mas que devem conduzir a decisões condenatórias quando existam razões para tal, em nome de uma cultura de responsabilidade que deve instalar-se a todos os níveis, que progressivamente permita superar a sensação geral de impunidade e de incapacidade de imputação de responsabilidades, mesmo quando são notórios actos ilícitos e lesivos do erário público.

Neste acto de posse, felicito vivamente cada um dos Juízes nomeados – Sr. Dr. João Cruz Silva (Presidente), Sr.ª Dr.ª Ana Reis, Sr. Dr. José Maria Cardoso, Sr. Dr. Victor Monteiro e Sr. Dr. Claudino Semedo – pela confiança em vós depositada, e manifesto aqui a honra e o privilégio com que promovo esta investidura.

Os vossos conhecimentos e o vosso perfil asseguram que o mandato que ora se inicia será profícuo e proveitoso para o Tribunal de Contas, para a gestão dos fundos públicos e, em última análise, para toda a comunidade Cabo-verdiana.

Desejo-vos os maiores sucessos no exercício dos cargos em que ora são empossados.