O Presidente da República lançou, hoje, durante a cerimónia de posse do Presidente do Conselho Superior de Magistratura Judicial, um veemente apelo a todos os órgãos de soberania, para “a importância da reafirmação permanente, na nossa prática institucional, dos valores e dos princípios democráticos”. José Maria Neves assegura que “a Presidência da República, continuará, dentro dos poderes e obrigações que a Constituição lhe compete, a fazer tudo para potenciar relações de colaboração e harmonia entre os órgãos constitucionais de que depende o bom funcionamento da nossa democracia”.
O Chefe de Estado, que falava a propósito do atraso que se verifica na nomeação dos Órgãos Externos ao Parlamento, incluindo o CSMJ, pediu que se evite condutas que enfraqueçam aqueles valores e princípios ou enfraqueçam as instituições, lembrando que Cabo Verde precisa de instituições mais fortes, capazes de assegurar a defesa e a preservação dos seus valores essenciais.
“A inação na designação dos demais membros do Conselho, não sendo impeditiva do funcionamento deste órgão, pode constranger o cumprimento cabal e regular das funções que lhe estão cometidas, dificultar a sua inscrição na arquitetura do ambiente social e político em que se integra e representará, sempre, o não respeito pela sua autonomia organizativa e de ação”, referiu.
José Maria Neves considerou, por outro lado, importante que haja melhorias concretas e papáveis no sistema da Justiça, para uma melhor imagem perante os cidadãos e as empresas e melhor funcionamento do setor. Tudo com vista a à almejada justiça, “justa, eficaz, célere, íntegra e transparente”.
Ao empossado, o Chefe de Estado desejou os maiores sucessos no cargo, cuja indicação mereceu a unanimidade dos seus pares, garantindo que contará com um PR atento ao sector da justiça e ao poder judicial e disponível para continuar a participar na edificação do sector.
Veja alguns trechos do discurso no video, a seguir, e/ou leia o discurso na íntegra, mais abaixo:
Discurso de Sua Excia. o Presidente da República, por ocasião da tomada de posse do novo Presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial, Dr. Bernardino Gonçalves
Permitam-me começar por expressar a minha satisfação nesta ocasião em que confiro posse ao Presidente do Conselho Superior de Magistratura Judicial, o qual passa assim a reunir todas condições para o exercício das suas competências, mas também o meu sentimento de inquietação pela demora na escolha de alguns novos membros deste órgão fundamental na organização da Justiça, para substituir aqueles cujos mandatos se encontram caducados há já algum tempo. Abro um pequeno parenteses para lembrar que, por manifesta falta de entendimento entre os principais atores políticos, esta situação de incumprimento no que se refere à renovação do mandato ou à escolha de novos membros de órgãos constitucionais, cujos atuais membros em exercício terão terminado há muito tempo o respetivo mandato, vem sendo, infelizmente, frequente entre nós.
O Presidente da República e o Parlamento obtêm a sua legitimação direta da vontade popular expressa eleitoralmente, o que lhes confere o poder de designar, no caso do Presidente, um membro (juiz) e mediante proposta dos restantes membros desse órgão o seu Presidente, cabendo ao Parlamento a designação de quatro membros do Conselho, pela maioria qualificada de dois terços dos deputados presentes.
Tal circunstância representa um indício claríssimo da natureza fundamental das competências que o Conselho Superior de Magistratura Judicial deve exercer na defesa dos interesses, que a Constituição lhe cometeu, e da deslocação da lógica da sua atuação para fora do combate político.
Natureza fundamental que não é compaginável com um exercício de poder que não cumpra as injunções constitucionais; o princípio da separação e interdependência dos poderes do Estado postula um feixe de obrigações recíprocas entre os órgãos de soberania, e entre estes e outros órgãos constitucionais, cujo cumprimento rigoroso é condição indispensável à existência de um Estado de Direito.
Cumpre, hoje, assim, o Presidente da Républica a sua obrigação constitucional, ao dar posse ao Presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial e não podia ser de outro modo, sob pena de colocar este órgão na impossibilidade de cumprir cabal e regularmente as competências que lhe estão cometidas.
Fica aqui um público e veemente apelo e exortação a todos os órgãos de soberania, para a importância da reafirmação permanente, na nossa prática institucional, dos valores e dos princípios democráticos e a certeza de que a Presidência da República, continuará, dentro dos poderes e obrigações que a Constituição lhe comete, a fazer tudo para potenciar relações de colaboração e harmonia entre os órgãos constitucionais de que depende o bom funcionamento da nossa democracia.
Evitemos as condutas que enfraqueçam aqueles valores e princípios. Ou enfraqueçam as instituições. Cabo Verde precisa de instituições mais fortes. Capazes de assegurar a defesa e a preservação dos seus valores essenciais. Os princípios da independência, da inamovibilidade e do juiz natural são vetores estruturantes do nosso sistema de justiça; os tribunais são independentes, mas a efetivação dessa independência pressupõe, entre outros, a organização e gestão do sistema.
A importância dos consensos e harmonia na realização de fins comuns em democracia, manifesta-se na designação dos membros dos órgãos externos ao Parlamento, exige um exercício do poder responsável, pluralismo e cultura democrática e afasta, por absolutamente indesejável, a ausência de cooperação entre os principais atores políticos que inviabilize o funcionamento desses órgãos.
Na sequência da revisão constitucional de 2010, em que o consenso foi possível, e, por unanimidade, aprovadas as disposições que consagraram ao Conselho a gestão e disciplina dos juízes, a nomeação, colocação, transferência e promoção dos mesmos, a administração autónoma dos recursos humanos, financeiros e materiais dos tribunais, e a nomeação do Inspetor Superior, é indispensável, para que a reforma da Justiça se materialize, que o Conselho cumpra firme e cabalmente aquelas funções.
E para isso, necessita de exercer em pleno o conjunto dos poderes funcionais que a Constituição e a lei lhe conferem, com vista ao exercício das suas atribuições, e assumir o seu papel como um dos principais órgãos da política judiciária que, no limite, participa ativamente na concretização do direito fundamental dos cabo-verdianos à Justiça e na proteção da independência do poder judicial.
A inação na designação dos demais membros do Conselho, não sendo impeditiva do funcionamento deste órgão, pode constranger o cumprimento cabal e regular das funções que lhe estão cometidas, dificultar a sua inscrição na arquitetura do ambiente social e político em que se integra e representará, sempre, o não respeito pela sua autonomia organizativa e de ação.
Minhas senhoras e meus senhores,
Felicito calorosamente, o Senhor Presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial, pela nomeação, mas também pela unanimidade da proposta subjacente que exprime o elevado grau de confiança que os seus pares lhe manifestam para o exercício deste novo mandato, fazendo votos para que tenha a força e a persistência suficientes para perseguir os fins últimos do Conselho Superior da Magistratura Judicial, melhorar a Justiça e dignificar a Magistratura Judicial.
Senhor Presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial,
Precisamos de melhorias concretas e palpáveis no sistema de Justiça; para melhorar a sua imagem perante os cidadãos e as empresas e melhorar o funcionamento do setor, é importante fazer acontecer a almejada justiça, justa, eficaz, célere, íntegra e transparente.
Nestas últimas semanas, tive oportunidade de intervir na posse do Presidente do STJ e na abertura do ano judicial, e tal como nesses momentos, volto a enfatizar que a população cabo-verdiana não tem escondido um sentimento de desilusão e perplexidade face a algumas situações vivenciadas, particularmente neste ano que termina, na Justiça cabo-verdiana.
Acreditamos que, felizmente, a esmagadora maioria dos Juízes tem comportamentos éticos, qualidade técnica e capacidade de trabalho para dar resposta às demandas qualitativa e quantitativamente crescentes. Mas não podemos ignorar os casos em que tal não acontece e em que o Conselho tem de procurar ser disciplinarmente rigoroso e severo, pois só desse modo se prestigia a Justiça e a Magistratura Judicial cabo-verdiana.
E para isso, é necessário que a Inspeção funcione e que abranja todo o serviço desempenhado pelos juízes desde a última inspecção a que foram sujeitos, independentemente dos tribunais judiciais em que foi desenvolvido e esteja especialmente atento à parte deontológica; ser Juiz não é só ter um simples emprego, nesta como noutras profissões, as regras, os valores e os princípios da deontologia e da responsabilidade têm de falar alto, sendo certo que, sem bons Juízes, nunca haverá Justiça boa.
Nos momentos conturbados do presente, o dever de preservar o prestígio desta instituição e contribuir para a confiança e a credibilidade na Justiça cabo-verdiana são ónus que, certamente, também, interpelam Vossa Excelência, Senhor Presidente.
Resta-me reafirmar votos das maiores felicidades e sucesso no exercício do mandato, garantindo que contará com um Presidente da República atento ao sector da Justiça e ao poder judicial, disponível para continuar a participar na edificação da Justiça cabo-verdiana, no limite dos seus poderes constitucionais, e, repetindo palavras ditas há bem pouco tempo, ciente da complexidade, sensibilidade e melindre de algumas situações recentemente vividas que desaconselham intervenções intempestivas ou que não acautelem que as instituições não podem ser fragilizadas de forma inconsequente.
O seu sucesso será o sucesso de toda a justiça cabo-verdiana.
Tenho a certeza que será bem-sucedido.